Declaração da Cimeira dos Povos da SADC,

Angola, 16 – 17 de agosto de 2023

‘Justiça – Participação Significativa – Inclusão.’

‘Justiça – Participação significativa – Inclusão’

 

Organizações da Sociedade Civil Angolana membros da plataforma TCHOTA acolheram diversos movimentos sociais da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral durante a Cimeira dos Povos em Luanda, realizada entre os dias  16 e 18 de Agosto sob o lema ‘Justiça, Participação Significativa e Inclusão’.

 

 Reunidos de comum acordo, os participantes à Cimeira de Luanda entendem:

  • Desafiar as narrativas e discursos dominantes e discutiram os direitos, as experiências e aspirações dos mais afectados pela dominação neoliberal e marginalização na região;
  • Comprometer-se uma vez mais com a inclusão de todas as mulheres, homens e crianças da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, nas decisões tomadas pelos Estados membros, através da solidariedade e acção colectiva para uma comunidade mais justa, pacífica e próspera para todas e todos;
  • Envolver e influenciar colectivamente os Chefes de Estado e de Governo da SADC no sentio de promoverem e apoiarem as aspirações e esperanças articuladas dos grupos pobres e marginalizados da região.

Num momento de grandes promessas e incertezas globais, como representantes das Organizações da Sociedade Civil partilhamos com os Chefes de Estado e de Governo,  as nossas reflexões, preocupações e recomendações sobre as condições prevalecentes que afectam os homens, as mulheres e crianças da Região, num momento de grande promessa e incerteza global.

  1. JUSTIÇA CLIMÁTICA.

Aumentar o alarme sobre os impactos desproporcionais da crise climática nas pessoas mais vulneráveis da Região, como exemplificado pelo Ciclone Freddy, que matou mais de 600 pessoas no Malawi e deslocou mais de mil outras. Notamos que as acções humanas, como a exploração de recursos naturais e os processos de industrialização dependentes de combustíveis fósseis, exacerbam as mudanças climáticas na região, resultando em secas cíclicas cada vez mais intensas, ciclones, na escassez de água, em conflitos relacionados ao clima e no deslocamento em massa de migrantes climáticos.

  • Exigimos a integração das questões das mudanças climáticas nas políticas públicas que devem ser mais inclusivas;
  • Exigimos maior investimento na adaptação climática e investimento no capital humano à luz da ética para a sustentabilidade e da justiça intra e intergeracional;
  • Exortamos que se tenha em consideração todos os riscos climáticos na tomada de decisão e nos instrumentos de governança, com atenção especial aos grupos mais vulneráveis, como os sem-terra, comunidades afectadas pela indústria extrativa mineira, pastores, pequenos agricultores, pescadores e outros grupos cujos meios de subsistência dependem directamente dos recursos naturais existentes e outros a serem explorados;
  • Apelamos a uma maior inclusão das comunidades na exploração dos recursos naturais e maior apoio financeiro para que as elas possam contribuir de forma sustentável para o alcance das contribuições determinadas nacionalmente (NDC).

 

  1. TRANSFORMAÇÃO DE CONFLITO

Moçambique e o conflito no leste da RDC continuam e exigem uma agenda cada vez mais concertada entre os membros da SADC. As medidas de contenção de conflitos devem considerar o impacto do militarismo na vida das comunidades nas zonas de conflito.

 

Exigimos respostas urgentes para a protecção das vítimas e a garantia tangíveis dos direitos humanos e humanitários das populações impactadas assim como exigimos uma maior transparência e coerência em relação às reais causas desses conflitos resultantes da exploração dos recursos.

 

A região Austral é considerada uma das regiões com maior estabilidade, no entanto, estes conflitos e a crescente militarização de grupos insurgentes bem como o fenómeno do terrorismo que afecta Moçambique, devem ser uma preocupação constante para  garantir uma paz efectiva e estabilidade nas áreas afectadas.

 

 

  1. JUSTIÇA ECONÓMICA

Reiterando as nossas preocupações compartilhadas sobre os impactos negativos das políticas económicas neoliberais em todos os países da Comunidade de Desenvolvimento da Região, enunciadas por medidas de austeridade injustas, o excesso de impostos, o alto endividamento e a capacidade reduzida dos Estados de fornecer bens e serviços públicos adequados às mulheres, crianças e homens vulneráveis na região.

  • Apelamos a um crescimento económico centrado nas pessoas e na distribuição justa dos recursos para modernizar as cadeias de valor locais, promover a agregação de valor através da competitividade e diversificação de produtos tendo como alcance a  promoção dum comércio livre e justo entre os países da comunidade;
  • Instamos os líderes dos estados membros da SADC a comprometerem-se com a remoção das barreiras não tarifárias e com a implementação rápida do regime comercial simplificado;
  • Apelamos aos líderes dos Estados Membros da SADC a investir e melhorar as estratégias de empoderamento económico das mulheres, apoiando deste modo participação de mulheres empresárias nas cadeias de valor regionais seleccionadas e facilitando de” facto e de jure” a sua inclusão financeira.
  • Nos termos da justiça social e económica, os líderes dos Estados membros da SADC devem facilitar a inclusão do sector informal, dos pequenos agricultores, pequenos comerciantes, mineiros artesanais, garimpeiros e comerciantes transfronteiriços materializando assim os acordos comerciais regionais e pan-africanos sobre zona de livre comércio já ratificados, incluindo o Acordo de Livre Comércio Continente Africano  e outros por ratificar no futuro;
  • Instamos as lideranças dos estados membros da SADC a endossar e apoiar o apelo para uma Convenção Tributária das Nações Unidas juridicamente vinculativa bem como a imposição de receitas redistributivas e impostos sobre a riqueza para atender às necessidades de recursos dos grupos pobres e marginalizados em todos os países da região;
  • Exigimos o fortalecimento dos esforços regionais para reduzir a dependência da dívida por meio de mecanismos de financiamento regional por via de processos transparentes e responsáveis de gestão da dívida assim como exigimos um apelo colectivo da África Austral por mecanismos de resolução da dívida global juridicamente vinculativos.

 

 

 

 

 

  1. JUSTIÇA DE GÉNERO E DIREITOS DAS MULHERES

 

Considerando que em Angola, em particular e não só,  as mulheres continuam enfrentando a informalidade e a pobreza extrema, mesmo com todos os tratados internacionais como o Protocolo de Maputo e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

  • As desigualdades de género devem ser discutidas considerando questões de classe social. Deste modo, o empoderamento deve ser entendido como um processo colectivo que acolhe as diferenças entre mulheres e meninas de diferentes contextos. Logo, torna-se urgente melhorar e garantir efectivamente um orçamento geral sensível ao género, focado em políticas económicas que empoderem financeiramente as mulheres e não só;
  • Exigimos políticas públicas que reduzam as desigualdades entre homens e mulheres, lembrando que é função do Estado aprimorar e monitorar os programas para que produzam resultados reais na vida das mulheres e meninas de todos os países da comunidade;
  • Exortar os líderes da SADC a promover e facilitar a inclusão das mulheres nos espaços de tomada de decisão, não apenas através da integração simbólica do género, mas também e sobretudo, no cumprimento dos compromissos reais e impactantes na luta contra as desigualdades de género.

 

  1. DIREITOS HUMANOS, GOVERNANÇA E DEMOCRACIA

Preocupados com o crescente autoritarismo, a redução do espaço cívico e o militarismo nos países da região:

  • Imploramos à todos os Estados Membros da SADC para que defendam as democracias abertas fundadas no constitucionalismo. O silêncio sobre questões políticas internas pode exacerbar os desafios económicos, levando à migração económica. Defendemos o reconhecimento do vínculo fundamental entre estabilidade política e prosperidade económica, através da criação de condições de vida sustentáveis para todos e todas.

Zimbábue.

Tendo em mente as próximas Eleições Harmonizadas no Zimbábue num ambiente eleitoral falho presidido por um órgão de gestão eleitoral partidário que propicia um acesso desigual à mídia, gerrymandering, leis draconianas, judiciário capturado e repressão contínua das vozes dissidentes e dos oponentes políticos

  • Alertamos para a possibilidade iminente de uma eleição disputada sem garantia de                                transferência    pacífica de poder;
  • Exortamos os líderes dos estados membros a reconhecer a crise de governação no Zimbabwe assim como exigimos uma intervenção significativa que assegure uma eleição pacífica, credível, livre e justa, obrigando desta forma o Governo do Zimbabwe a aderir estritamente aos princípios e orientações que regem as eleições; pertinentes para a obtenção de condições mínimas para um
  • Outrossim, instamos os chefes de estados membros a obrigar o órgão de gestão eleitoral no Zimbábue a divulgar imediatamente as listas dos eleitores de acordo com a constituição do país.

Eswatini

Envergonhados pelo fracasso contínuo dos líderes dos estados membros da SADC que não  tomam medidas decisivas para resolver a crise de governança no país, apesar das inúmeras missões de averiguação e do compromisso de facilitar um processo de diálogo nacional liderado pela SADC em Eswatini solidários com as massas reprimidas de Eswatini pedimos:

  • A libertação imediata dos prisioneiros de consciência
  • A revogação da extinção dos partidos políticos;
  • A revogação de todas as leis repressivas, incluindo a Lei de Sedição e Actividades Subversivas de 1938 (SSA) e a Lei de Supressão de Terrorismo de 2008;
  • A implementação de um processo de diálogo nacional inclusivo conduzido pela SADC com vista ao aprovação de uma constituição democrática que viabilizem a realização de eleições livres e justas sob uma dispensa multipartidária;
  • A SADC conduza uma investigação imparcial sobre o cruel assassinato de Thulani Maseko e advogue uma justiça para as vítimas da repressão política no Reino de Eswatini

 

  1. MIGRAÇÃO E Apatridia.

No reconhecimento

  • das obrigações dos Estados sob várias convenções e tratados internacionais e regionais para proteger a dignidade e os direitos de todas as pessoas, incluindo seus direitos contra tratamento cruel, desumano e degradante e privação arbitrária de liberdade
  • dos compromissos assumidos por Estados da SADC, incluindo o “Migration for Southern African Dialogue (Diálogo sobre Migração na África Austral), recomendamos:
  • A harmonização e aplicação doméstica de todas as leis, normas e padrões internacionais e regionais aplicáveis aos direitos das pessoas documentadas, incluindo apátridas e migrantes;
  • Assegurar que as pessoas detidas com base na sua situação documental sejam tratadas com humanidade e, queindependentemente da sua situação migratória, nacionalidade, género, etnia, raça ou outras, recebam toda a protecção legal aplicável, de acordo com o direito internacional, e demais normas e padrões aplicáveis;
  • A implementação de mecanismos contra a detenção de pessoas indocumentadas, incluindo mecanismos para alternativas não privativas de liberdade à detenção.

 

 

  1. GOVERNANÇA DOS RECURSOS NATURAIS

Observando que numerosas comunidades que servem como hospedeiras para operações de mineração continuam a sofrer várias formas de violações de direitos humanos, com suas queixas amplamente ignoradas e não abordadas. A transição energética justa poderia ser apenas colocando as pessoas e o planeta no centro. Isso só aconteceria através de consultas significativas, participação e inclusão de comunidades marginalizadas e vulneráveis. As comunidades devem recuperar seu poder e desmantelar o modelo capitalista de mineração que mina suas vozes.

  • É necessária uma política industrial regional que inclua o beneficiamento mineral e a aglomeração regional para promover o investimento, o comércio e a livre circulação de pessoas entre os Estados-Membros. Por outras palavras, não devemos exportar os nossos recursos minerais para fora do continente e “recomprá-los a um preço mais elevado”.
  • O trabalho infantil e a exploração devem acabar, e as receitas dos minerais de transição devem ser canalizadas para políticas sociais sustentáveis que apoiem as crianças de famílias indigentes a aceder à educação subsidiada.
  • Devem ser promovidos regimes fiscais transparentes para travar a corrupção, a evasão fiscal e as desigualdades dentro e entre as nações.
  • Os Estados-membros da SADC devem adotar o Mecanismo de Reparação de Queixas para lidar com conflitos que possam emanar de regimes de tributação e mineração que não beneficiem as comunidades ou impactos prejudiciais envolvendo ASM e minerais de transição. Isso garantirá que todas as queixas e preocupações levantadas por várias partes interessadas em relação às operações de mineração sejam tratadas de maneira consistente e justa, ao mesmo tempo em que promove práticas de mineração responsáveis e sustentáveis que priorizam o bem-estar das comunidades locais e do meio ambiente.

 

 

 

  1. PLANO DE DESENVOLVIMENTO ESTRATÉGICO INDICATIVO REGIONAL DA SADC

Cientes do potencial transformador do Plano Indicativo de Desenvolvimento Estratégico Regional da SADC.

  • Encorajamos o Secretariado da SADC a expandir a participação dos NSAs (Actores não Estatais) nos processos regionais através da operacionalização total do Mecanismo Regional de Envolvimento dos NSA e da inclusão dos NSA nas consultas regionais e nos grupos de trabalho técnicos para documentar a monitorização, a avaliação, os relatórios e as iniciativas regionais planeadas conforme descrito no RISDP ;
  • Exigimos o estabelecimento de um mecanismo de financiamento para facilitar a participação dos NSAs tanto a nível regional como nacional;
  • Instamos os Estados Membros da SADC a envolver os NSAs nos seus países nas Directrizes de Acreditação de NSA propostas, seguidas da aprovação atempada das directrizes na próxima reunião do Conselho de Ministros da SADC;
  • Exortamos os Estados Membros da SADC a acelerar a operacionalização dos Fundos de Desenvolvimento Regional e de Desenvolvimento Agrícola para garantir o apoio adequado à implementação do RISDP, particularmente no sentido de apoiar os pequenos agricultores e os sistemas alimentares diversificados nutritivos sustentáveis assim com as intervenções de SSR para adolescentes e pessoas jovens.

 

 

  1. Movimentos Juvenis e Estudantis

O futuro dos jovens da região da SADC só poderá er alcançado através da paz, da liberdade, da justiça do respeito pelos direitos humanos.  A este respeito, queremos enfatizar que os jovens estão desapontados com a falta de visão e inconsistência das políticas e acções dos estados membros da SADC no que diz respeito ao empoderamento,  ao desenvolvimento,  à inclusão e plena participação dos jovens nos processos de tomada de decisão.

De resto, os jovens estão alarmados com a falta de vontade política para enfrentar os problemas perenes que os  afectam tais  como o alto nível de desemprego, as desigualdades,  a pobreza, a má gestão da migração e a mudança climática, bem como a “usurpação” do espaço democrático na região.

Os jovens, em contrapartida, resolvem:

  • Retaliar a importância da participação plena e efectiva da juventude e das organizações juvenis aos níveis local, nacional, regional e internacional na política, na liderança e nos processos de tomada de decisão;
  • Desafiam o extractivismo , exijem justiça climática e assim como assumpção da propriedade total dos recursos naturais da região para o desenvolvimento centrado nas pessoas;
  • Exigem uma educação descolonizada de qualidade acessível localmente e igualmente acessível na região;
  • Levam a cabo acções imediatas para permitir a livre circulação de bens e pessoas na região assim como ea remoção de vistos para permitir uma verdadeira integração e desenvolvimento regional.

 

 

Para mais informações e comentários, por favor contacte: Janet Zhou, Secretária Geral , SAPSN, +263775415685, janet@zimcodd.co.zw | Nelson Joao, Convenor – Angola Local Organisation Committee, +244913575023 , neljoao7@gmail.com

 

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